segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Favelismo institucionalizado

  
O Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro distribuiu este mês, na última feira Construir, um livreto no qual canta loas à legislação que institui a autovistoria obrigatória nas construções em geral. Uma publicação bem cuidada e bem escrita, exceto pelo deslize do 'mal' uso das edificações, na página 5, caracterizando, cabe ressaltar, mau uso da língua materna, coitada.

A Lei Municipal Complementar 126/2013, da capital, e a Lei Estadual 6.400/2013 (ainda não regulamentada) trazem, sem dúvida, um benefício à sociedade, porque estimulam a manutenção das construções por via transversa, pela punição aplicada ao relaxamento e ao descaso, no intuito maior da segurança de quem as utiliza e, por tabela, da cidade como um todo.

Mas tem um porém: dentre as exceções, que ficam fora da obrigatoriedade, além das habitações uni e bifamiliares com até dois pavimentos e área construída de até 1.000 m², aparecem também as Áreas de Especial Interesse (Social); leia-se: favela. Ou seja, aqueles prédios de cinco, seis, sete e até mais pavimentos, erguidos ilegalmente, em área degradada, esgueirando-se nas construções contíguas, sem prospecção de solo, sem licença, sem projeto, sem acompanhamento técnico, sem habite-se e sem coisa nenhuma, são agraciados pelo legislador - e pelo poder Público, em última análise, já que agora regra válida - com a benesse de estarem isentos da fiscalização periódica.

Em bom Português: se cair, caiu. Afinal, é na favela. E terá sido por causa de outra lei, a de Murphy.

Talvez não seja de se estranhar mesmo. Alguém viu o CREA, que fez questão de manifestar-se a favor da autovistoria mas deixou passar esse detalhe, levantar a voz em defesa dos Engenheiros e da Engenharia, quando se fizeram as piores profecias e se disseram todas as asneiras possíveis sobre a fragilidade da sustentação da cobertura do Estádio João Havelange (Engenhão), pondo na lama os nomes dos responsáveis técnicos que lá atuaram? E tudo, não por acaso, à sombra das negociações para a privatização do Maracanã, que interessava ao prefeito do Rio e ao governador do Estado? Um silêncio, no mínimo, suspeito.

Pois é. Voltando à lei da autovistoria. Uma vez mais, a favela é tratada de modo diferente da cidade. Por interesse político. Com uma visão canhestra quanto àquilo que a cidade, como ente em que vivemos, representa. Para mim, prova inconteste daquilo que eu afirmo: favela não é cidade.

O Rio de Janeiro está precisando desesperadamente de mais cidade em si mesmo.

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